A influência holandesa no desenvolvimento de Recife
Dos Canais Coloniais à Evolução Urbana
Recife é frequentemente chamada de Veneza Brasileira por seus canais e pontes. Embora o apelido seja mais impulsionado pelo romance do que pela semelhança com Veneza, a verdadeira inspiração da cidade vem de outra cidade europeia com vias navegáveis – Amsterdã, a “Veneza do Norte”1
Tanto Amsterdã quanto Recife são cidades portuárias construídas sobre deltas, e suas histórias estão intimamente entrelaçadas. Quando os holandeses governaram Pernambuco no século XVII, fizeram de Recife – então chamada Mauritsstad – a capital de sua colônia. Na mesma época, Amsterdã estava desenvolvendo seus canais icônicos, um design que João Maurício de Nassau, governador do Brasil Holandês, tentou replicar em Recife, planejando seus bairros centrais e encomendando suas primeiras pontes2.
A conexão entre as duas cidades ressurgiu no início dos anos 2010, quando especialistas, universidades e instituições de ambos os lados do Atlântico lançaram o Projeto RxA para enfrentar desafios urbanos compartilhados [1]. O que começou como uma série de videoconferências cresceu para uma missão de levantamento holandesa a Recife, com workshops e seminários. Posteriormente rebatizada como RxH, a iniciativa estabeleceu um intercâmbio contínuo entre as cidades [2].
Essa conexão do século XXI, no entanto, é apenas o último capítulo de uma história muito mais antiga.
De Olinda a ‘Olanda’
O conflito luso-holandês fez parte de uma luta europeia mais ampla pela dominação durante o século XVII. Com a Espanha e Portugal unidos sob uma mesma coroa durante a União Ibérica (1580-1640), os holandeses, que haviam recentemente conquistado a independência da Espanha na Guerra dos Oitenta Anos, viram uma oportunidade de desafiar tanto os espanhóis quanto os portugueses. O objetivo dos holandeses era enfraquecer o poder espanhol nas Américas e tomar o controle das importantes rotas comerciais, incluindo o comércio de açúcar no Brasil. Essa mudança estratégica foi fundamental para sua decisão de invadir Pernambuco e reformular Recife. A invasão de Pernambuco foi motivada por outros dois fatores chave além da importância da região na produção de açúcar: sua proximidade estratégica com a Europa e sua relativa vulnerabilidade em comparação com a capital portuguesa [4].
Antes de sua chegada, no entanto, o poder estava em Olinda. A mudança de Olinda para Recife como capital de Pernambuco foi impulsionada por fatores práticos e simbólicos. A localização de Olinda tornou-se uma desvantagem à medida que o comércio se expandia. Recife, com seu porto natural, tornou-se o centro comercial e, com o tempo, sua importância econômica fez com que substituísse Olinda como capital.
Embora a ascensão de Recife tenha sido impulsionada pela economia, os habitantes de Olinda viam a perda de seu status como um castigo divino por seu orgulho e excesso. O sermão do frei Antônio Rosado, de 1630, capturou essa crença, afirmando que “de Olinda a Holanda, não há nada mais do que a troca de um i por um a”, sugerindo que a queda da cidade foi uma consequência moral [4]. As elites de Olinda costumavam olhar de cima para Recife por ser uma cidade voltada para o comércio, mas à medida que Recife crescia, sua própria importância diminuiu.
Conclusão
A evolução de Recife de um modesto porto à sombra de Olinda para um centro comercial moldado pelos holandeses reflete sua adaptabilidade. Embora seus laços com Amsterdã possam ajudar a informar seu desenvolvimento, a relação da cidade com a água continua sendo um desafio persistente.
Embora ambas as cidades compartilhem semelhanças e laços históricos, Amsterdã é considerada uma cidade da água, enquanto Recife é mais como uma cidade que tem água. Em outras palavras, Recife não faz pleno uso de seus canais, etc. De acordo com um assessor da autoridade pública de águas de Amsterdã, “parece haver pouca integração dos desafios no planejamento urbano em Recife. Lidar com os desafios da água é, da nossa perspectiva europeia, essencial para as cidades do futuro.”
Como parte da colaboração entre Brasil e Países Baixos, o conceito da Water Tree surgiu em 2012, buscando integrar os sistemas hídricos de Recife ao planejamento urbano [6]. Enxergando a cidade como uma árvore, a água pode agir como o elemento central que conecta o ambiente existente, a topografia e os espaços públicos. Esse referencial guiou projetos como o Parque Capibaribe3 – que está aos poucos ganhando forma – e intervenções em Graças, transformando ruas em espaços verdes e requalificando as margens dos rios para uso público.
Através de anos de experimentação, a Water Tree se mostrou valiosa como uma ferramenta para o planejamento urbano, oferecendo uma narrativa coesa. Ao ver a cidade como um sistema interconectado, oferece uma base para a revitalização sustentável, adaptável a diversos contextos urbanos – incluindo, talvez, potenciais aplicações futuras nos Países Baixos.
Informação adicional
1 - The First Jews in the Americas
Fontes
2 - Recife Exchange Amsterdam (16m)
3 - Maurício de Nassau, um gênio civilizador no Brasil
4 - Quantas Olindas cabem em um sítio histórico? (pdf)
5 - Sketches of residence and travels in Brazil (1845)
Tradução: Olinda continuou sendo a capital da província por cerca de duzentos anos. Embora, em termos de beleza, sua localização não pudesse ser superada, ela não era favorável para o comércio, por estar muito distante do "recife" ou arrecife, que forma o único porto nas proximidades. Uma cidade gradualmente foi crescendo perto do recife, sendo chamada por esse nome. Para seus habitantes, os magnatas de Olinda cultivavam o mais soberano desprezo, chamando-os de mascates ou vendedores ambulantes. No entanto, o interesse, por fim, prevaleceu sobre o romance e a aristocracia. A cidade de Recife tornou-se a capital; e Olinda, embora ainda orgulhosa de sua localização e de sua grandeza inicial, degenerou na insignificância de um subúrbio para sua rival.
6 - Good practice: creating a conceptual framework as a guideline for urban redevelopment (pdf)
A Ponte Maurício de Nassau foi a primeira ponte no Brasil
Um parque de 31 km de extensão ao longo do rio Capibaribe, que atravessa a cidade